Crítica: O Papa e a Bruxa
Crítica da Peça "O Papa e a Bruxa"
Polvos e Polvinhos,
Arrumei um jeito ótimo de conseguir temas para os finais de semana. Farei assim: Sábado uma homenagem a alguém normalmente esquecido pela maioria. Domingo uma crítica de peça e/ou texto.
Não sou
Décio de Almeida Prado nem pretendo ser, mas darei meus pitacos.
Fui assistir ao "O Papa e a Bruxa" no espaço Parlapatões.
O Texto é de Dário Fo ganhador do Nobel de literatura de 1997, dramaturgo e comediante italiano, foi ator e costuma colocar suas idéias no palco antes de colocá-las sobre o papel. Tem o
belíssimo infame título de ser autor do " programa mais blasfemo jamais levado ao ar na história da televisão mundial" segundo a Igreja Católica. Sua obra é composta basicamente de comédias farsantes.
Um desses que costumam chamar "revoltados", filho de pais socialistas, teve os estudos interrompidos em meio à 2ª Guerra Mundial por ter sido convocado a lutar ao lado de Mussolini, fugiu e escondeu-se em um sótão. Quando finalmente a guerra acabou abandonou seus estudos (arquitetura) indignado (veja só) com a corrupção existente no meio.
Foi um dos responsáveis pela renovação dos teatros italianos (
Teatri do piccoli, em português Teatro Pequeno ou algo parecido).
"Os Parlapatões e a história da retomada do Teatro de Rua na cidade de São Paulo caminham juntos. Da necessidade de se expressar com maior liberdade, longe das gastas convenções do teatro de então, o grupo se formou. Em 91, começaram apresentando números circenses e passando o chapéu. Aos poucos, os números ganharam uma forma teatral que gerou os dois primeiros espetáculos: Nada de Novo e Bem Debaixo do Nariz. (continua
aqui...)
"A escolha do texto "O Papa e a Bruxa" tem ao menos dois méritos. O primeiro e mais claro é trazer de volta ao Parlapatões o "quê" circense que fez parte deste grupo. A segunda é fazer uma crítica importante à Igreja num momento em que não está em evidência nenhum caso de pedofilia por parte de padres e afins. Erro cometido por exemplo, com Marco Nanini ao montar "O Bem Amado" (há pouco tempo) numa época em que nada é mais óbvio que dizer "políticos são corruptos".
O público (como praxe na praça Roosevelt) é chamado a entrar no teatro por um sino e, atento, perceberá uma luz no canto direito da platéia iluminando um chapéu preenchido por um tijolo e uma flor; justa homenagem às origens circenses.
As músicas que são ouvidas enquanto a platéia aguarda o início do espetáculo são escolhidas a dedo. Cuidado raramente visto nos teatros hoje em dia. O espectador já está sendo levado a atmosfera do que está por vir.
A peça se inicia com um inusitado aviso para que desliguem os celulares, pragas da modernidade. A surpresa, já nos ensinou Chaplin, faz a comédia.
Ao abrir o pano (feito de retalhos) temos um cenário bem cuidado, embora não se entenda o porquê de uma escada que fica alheia à peça até o início do segundo ato, onde é utilizada até a metade deste ato, voltando a ficar alheia a peça dali em diante.
O pano de fundo nos quer levar à Capela Sistina enquanto o canto esquerdo nos mostra uma janela que reproduz o local onde o papa fala com seus fiéis do Vaticano. Janela cujo céu é pintado com um azul claro que nos remete às igrejas evangélicas o que nos poderia levar a crer que não se fala apenas da Igreja Católica, embora a utilize como tema central.
Um figurino muito bem cuidado, este sim sem adjacentes desnecessários, e prático, nos trás outras referências circenses, que o público percebe pelas roupas de baixo de alguns atores.
A peça tem um ritmo funcional apesar de uma ou outra cena mais lenta. Uma cantoria inicial divertida e impactante embora não tão necessária ao enredo. É assim que somos jogados dentro de um mundo onde todos os pontífices (incluindo o maior deles, o papa) tem, no mínimo, um celular.
Temos um papa preocupado com a relação com seus fiéis, sentindo-se perseguido, começa a sentir-se paranóico e perseguido. O que temos durante o primeiro ato é a apresentação dos conflitos do protagonista e os possíveis caminhos que começa a tomar para resolvê-los.
A platéia começa a se cansar quando acaba o primeiro ato. Mais um acerto da cuidadosa direção. Após o intervalo, no entanto, temos um cenário completamente diferente onde a escada finalmente parece ter encontrado seu lugar. Um porão cuja superfície não trás solução ou respostas é também muito bem cuidadoso com os objetos de cena. Um cartazcom dizeres atuais tomam o lugar da janela no canto esquerdo.
O que é feito ali é a escolha do caminho a ser tomado pelo protagonista para resolver sua paranóia quanto à rejeição dos fiéis, refletida em problemas físicos no corpo do papa. O problema é que toda a parte do porão parece estar à parte do texto, como um enxerto sobre um texto já escrito. Engraçada, mas péssima para o ritmo da encenação.
De volta ao vaticano temos um papa renovado e com políticas modernas, adorado pelo público mais jovem e odiado pelo setor mais retrógrado, na figura do arcebispo.
A atuação é, no geral, muito boa. Elementos circenses muito bem incorporados à farsa, incluindo um anão que dá uma aula de como surpreender a platéia, mais um acerto da direção. Embora um pouco exagerada no volume da voz, a peça e o texto são muito bem trabalhados pelos atores. Deles o único erro parece a exagerada entrada dos "cacos" (gíria teatral para falas improvisadas) que trazem Sarney e Belchior entre outros.
Vale a pena conferir o trabalho.
Direção: Hugo Possolo
Com: Parlapatões
Duração: 95 minutos
Classificação: 14 anos
Texto: Dario Fo
Tradução: Luca Baldovino
sexta: 21h.
sábado: 19h e 22h.
domingo: 20h.
Pça. Franklin Roosevelt, 158 - República - Centro. Telefone: 3258-4449.
Aceita os cartões Amex, Diners, MasterCard, Visa. Ingresso: R$ 15 (sex.) e R$ 20 (sáb. e dom.).